quinta-feira, 30 de abril de 2009

Você já fez seu estoque culinário de Tamiflu, ops, de anis estrelado?


Não sei se vocês se lembram que o preço da especiaria foi às alturas na época da gripe aviária. E que depois sumiu do mercado. É que o anis estrelado é usado para fazer o Tamiflu, o antiviral da Roche que promete não curar a gripe suína mas aliviar os sintomas. O medicamento impede que o vírus se multiplique e que invada outras células. Acontece que a Roche detém 90% da produção de anis estrelado e ele já anda falhando no mercado. O que eu tenho aqui dá para o gasto pessoal por um bom tempo ainda. Mas, quem não tem, não custa se precaver com uns graminhas (a história envolvendo a Roche e anis estrelado pode dar pano pra manga, mas o assunto aqui vai ficar na cozinha mesmo).
A especiaria de nome autoexplicativo (anis em forma de estrela) é fruto da árvore Illicium verum, pertencente à família das Illiáceas. Não deve ser confundido com a erva-doce ou anis verdadeiro (Pimpinella anisum) e tampouco com o manjericão-anis (já vi venderem por aí a erva como "anis estrelado"). É chamado de anis por ter aroma similar ao anis verdadeiro, assim como o manjericão-anis. Mas, indo a fundo no seu perfume, percebe-se um blend de anis com alcaçuz, aromático e amargo.
Lá no seu habitat, bosques tropicais do sul da China e norte do Vietnã, a árvore da badiana ou badiana-de-cheiro, que pode chegar a 9 metros de altura, tem folhas elípticas, relativamente côncavas e as flores variam de amarelas a vermelhas. Já a estrela lenhosa que conhecemos é o fruto de coloração marrom, com 5 a 8 pontas que, por uma fenda, deixam aparecer as sementes lisas e brilhantes. Ambos podem ser usados pra aromatizar, sendo que as sementes são mais suaves.
Na medicina popular a espécie é empregada há séculos para tratar problemas de falta de apetite, dispepsias, gastrites, enterites, flatulência, espasmos gastrointestinais e problemas respiratórios, sendo que a atividade expectorante já foi comprovada cientificamente. Uma de suas substâncias principais é o anetol, que tem atividade antimicrobiana e antifúngica, mas tem também apresenta hidrocarbonetos, linalol e cineol. Bebês e mulheres grávidas devem consumir com cautela.
Já como especiaria aromatizante é empregada principalmente em infusões e na preparação de licores. Pratos feitos com ela podem ser provados em restaurantes chineses, que usam o tempero em carneiros, porcos e aves. Além de ser ingrediente da famosa mistura de especiarias em pó (cinco-especiarias: pimenta de Sechuan, cássia ou canela, canela, erva-doce e anis estrelado), aromatiza vários tipos de pratos salgados, doces e chás. No Vietnã, ele é usado para temperar o caldo Pho (já dei receita aqui, uma versão sem a especiaria, pois usei manjericão-anis).
Em pó, pode ser usado também para dar aroma a pães doces e salgados, conservas, compotas, doces, frutas e tortas. Combina bastante com chocolate quente, bolo de chocolate e bebidas como chás, infusões, leite, café, licores e xaropes. Dá sabor especial se adicionado em pequena quantidade em pratos a base de peixes e frutos do mar, principalmente caldeiradas e caldos.
Como não precisamos ter medo de comer carne suína por causa da gripe (mas medo da gripe, tenho, sim) e porque o anis combate os sintomas da doença, aproveitei para unir os dois ingredientes para ganhar resistência, ficar forte. Fiz para o almoço de hoje costelinha suína com anis estrelado em pó, limão e pimenta.

Também fiz um chá super-hiper-mega-antigripal. Quando fiz curso de fitoterapia, um professor disse que qualquer infusão ou decocto que agrupasse mais que cinco itens não era remédio, era bruxaria. Pois aqui vai, então, minha poção mágica e ela costuma funcionar com a Ananda, que não reclama da pimenta nem do alho, quando resolvo acrescentar. A quase doutora sempre pede chazinho de mãe quando está gripada.




Costelinha de porco com anis estrelado, limão e pimenta

1 kg de costelinha de porco
1 colher (chá) de sal
2 colheres (sopa) de suco de limão
1/4 colher (chá) de anis estrelado em pó
1 colher (café) de pimenta-do-reino
1 xícara de água
1 cebola fatiada
Meia pimenta dedo-de-moça vermelha sem sementes picada
Meia pimenta dedo-de-moça verde sem sementes picada
1 colher (chá) de gengibre ralado
Gotas de limão
2 colheres (sopa) de coentro e cebolinha picados
Tempere a costelinha com o sal, suco de limão, anis e pimenta-do-reino. Deixe pegar gosto por 2 horas. Coloque numa panela com a água e leve ao fogo alto. Quando ferver, tampe, abaixe o fogo e deixe cozinhar até secar a água (cerca de meia hora ou mais). Deixe, então, a carne dourar na própria gordura. Junte a cebola, as pimentas e o gengibre e misture até a cebola ficar macia. Antes de servir, junte gotas de limão e as ervas e misture. Couve e arroz acompanharam.

Rende: 6 porções




Chá para gripe com anis estrelado e pimenta

Leve para ferver 2 xícaras de água com 2 estrelas de anis, um pau de canela, uma fatia de gengibre, um pedaço de casca de tangerina e 2 cravos. Cozinhe por cinco minutos. Junte um pedaço de pimenta dedo-de-moça, desligue o fogo e espere amornar. Por fim, junte 1 colher (sopa) de mel ou a gosto e glupt. Não há virus que resista. Depois de uma suadeira, você vai se sentir bem melhor. E, acredite, não fica ruim, não.

cambuquira de chuchu


Achei que cambuquira de chuchu fosse coisa da minha avó no melhor estilo "não tem cão, caça com gato", mas na semana passada comprei a verdura na feira orgânica do Parque da Água Branca e só notei que os brotos não eram de abóbora, os clássicos, quando cheguei em casa e notei a folha mais lisa e resistente e os lindos mini-frutos. Quem vendeu, não disse. Mas, tudo bem. Talos macios, folhas, chuchuzinhos e gavinhas, foram todos pra panela. Aproveitei a fama de boa combinação com milho (veja aqui Sopa de milho com cambuquira) e fiz uma mistura com milho inguirim que também comprei na feira para comer com músculo. Se ninguém contar, não se percebe muito a diferença de cambuquiras, a não ser por ser a de abóbora mais macia. Da mesma família as duas plantas, em sabor são muito parecidas.
Nota: do tupi kãbu'kira, cambuquira quer dizer grelos de erva. Sobre grelos, veja aqui.
Cambuquira de chuchu com milho inguirim e pimenta-biquinho
2 colheres (sopa) de azeite
2 dentes de alho picados
Meia cebola média picada
1 xícara de grãos de milho inguirim (milho novinho)
500 g de cambuquira aferventada por 3 minutos em água salgada, escorrida e picada
2 colheres (sopa) de pimenta-biquinho em conserva
Sal e pimenta-do-reino a gosto
Numa panela, aqueça o azeite e doure nele o alho. Junte a cebola, espere amaciar. Junte o milho, misture, junte um pouco de água quente, só para cobrir. Não coloque sal para não endurecer a pele dos grãos. Tampe a panela e cozinhe até amaciar (cerca de 10 minutos). Junte a cambuquira pré-cozida e picada e misture bem. Prove e adicione sal, se necessário. Junte a pimenta-biquinho, tempere com pimenta-do-reino e sirva.
Rende
: 4 porções

Eu também gosto de couve


Esta Dendê gosta de almeirão amargo à couve-manteiga. De azedinha à flor de capuchinha. Ai, o que será do meu jardim? Para a ração, faz cara de desdém.




quarta-feira, 29 de abril de 2009

Lambari frito



Outro dia mostrei aqui sardinha espalmada, empanada e frita e a amiga leitora Ana sugeriu lambaris no fubá. Eu disse que tinha-os congelados e os faria. E fiz. Não aqueles que empanei com farinha de trigo, também muito bom, e comi sem cerimônia nem fotos. Mas, apesar da pressa, consegui fotograr estes que comprei recentemente.
Empanados em alguma farinha (mandioca, fubá e trigo), fritos, crocantes, já comi em Piraju, Fartura, Piracicaba. Nos bares, em porções, com cerveja. Quem resiste? É o peixinho que a sobrinhada, quando criança, pescava num córrego que passava mais possante no meio do nosso sítio lá em Fartura. Era uma farra. Uma dúzia deles, que minha mãe fritava, alegrava o dia e virava aperitivo antes do almoço ou do jantar.

Bem, que identidade exata tinha os peixinhos de Fartura ou tem estes da foto eu não sei, pois sob o nome de lambari agrupam-se espécies de água doce de três gêneros diferentes: Hemigramus, Moenkhausia e Astyanax. E na Amazônia eles são chamados de matupira ou matupiri, enquanto no nordeste algumas espécies são chamadas de piavas (embora a piava conhecida como tal em outros cantos seja outra, que já mostrei
aqui). Em comum estes gêneros pertencem à subfamília Tetragonopterinae, e à família Characidae. No Estado de São Paulo o gênero mais expressivo é o Astyanax. Talvez seja este da foto.

Comprei no Mercado da Lapa logo uns dois quilos pois estavam fresquinhos. O duro é que peixes pequenos o peixeiro não limpa. Mas, tudo bem, não me importo muito de limpar peixes. Lavei, descamei, destripei e congelei. No domingo tive que trabalhar, então o que fiz logo cedo foi descongelar meia dúzia para mim e para o Marcos. Na hora de comer, fui lá, temperei os peixinhos, empanei, fritei e comi com arroz molinho que fiz com abobrinha e pimentão. No setor minerais e vitaminas, colhi no jardim umas folhinhas de verdura (couve, azedinha, capiçoba) e cada um temperou sua salada no prato. O limão que regaria o peixe já temperei com um pouco de coentro e pimenta e isto deu ao peixe de rio um quê de mar. A carne é deliciosa, branquinha e suave, sem aquele pitiú que às vezes têm o peixe de rio. Uma breja gelada e nhac. Não sobrou nada, nem rabo nem cabeça, só um pedacinho da espinha mais dura. Em uma hora estava de volta ao trabalho.

Lambari frito


6 lambaris limpos
½ colher (chá) de sal
1 pitada de pimenta-do-reino
1 colher (chá) de suco de limão
3 colheres (sopa) de farinha de trigo
3 colheres (sopa) de fubá de canjica (mais fino, tem mais amido, gruda mais)
1 colher (chá) de gergelim preto
Para colocar sobre o peixe: 2 colheres (sopa) de suco de limão misturado com 1 colher (sopa) de coentro picado e 1 pedaço de pimenta dedo-de-moça picado
Tempere os peixes com o sal, a pimenta-do-reino e o limão. Misture a farinha de trigo, o fubá e o gergelim. Passe os peixes nesta mistura, pressionando bem. Frite em óleo quente que cubra os peixes. Numa frigideira média, no máximo, três de cada vez. Regue o limão temperado por cima e sirva com arroz e salada.
Rende: 2 porções
Arroz com abobrinha e pimentão vermelho

Preparei o arroz mais ou menos do jeito que todo mundo faz, só que juntei abobrinha e pimentão e cozinhei mais demoradamente para que ficasse meio papa: refoguei 1 colher (sopa) em 1 colher (sopa) de óleo, juntei 1 xícara de arroz branco lavado, mal mexi e já juntei 2 xícaras de água fervente e 1 colher (chá) de sal. Deixei ferver e juntei meia abobrinha ralada grossa e meio pimentão vermelho ralado grosso – só a polpa; a pele ficou na minha mão. Assim que voltou a ferver, abaixei o fogo, suspendi um pouco a panela e deixei cozinhar lentamente por cerca de 20 minutos.
Rende: 4 porções

terça-feira, 28 de abril de 2009

O professor da farinha, o filme

Quem é do Slow Food já viu o filme "O professor da Farinha" dos amigos do Rio, Manuel Carvalho e Teresa Corção. Quem não viu, vale a pena conferir a história destes dois produtores tão brasileiros de farinha, agora no you tube. Prestem atenção na feitura do paneiro pelo Seu Bené, na produção da farinha d´água, na cor amarelinha... Já falei muito dele por aqui.

A revolta dos suínos


Numa rodovia no Sudoeste paulista. Clique & Amplie!

"...não há negligência mais vergonhosa do que aquela para com o alimento que comemos para viver. Quando existimos sem consideração ou agradecimento, não somos homens, mas bestas.” MFK Fisher

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Turu com terroir do mangue marajoara

Já mostrei o turu e falei do bichinho AQUI.

Desculpe aí, hem, pessoal. Desta vez a charada estava hermética demais e, a não ser pela cestinha com motivos marajoaras e a folhinha de chicória-do-pará que cresce aqui no meu jardim e deixei como dica na foto, realmente algo empanado e frito poderia ser qualquer coisa: cebolas fritas ou tempurá de camarão como pensaram a Rebecca e a Pat. Ou ainda pele de frango à pururuca, como quiseram o Rogério e a Nina. Sim, bem que poderia ter saído desta cozinha uns torresminhos assim – uma vez tirei toda a pele de um frango para deixá-lo mais light, fritei e comi todo o courinho crocante, que eu poderia ter deixado grudado à ave e dividido com a família.

Poderia ser também polvo como chutou a Mad, ou coró a milanesa – e aqui o Rui passou perto; lulas, cebolas, iscas, como arriscaram o Zé Augusto, a Marília, a Turmalina, o Paulão e o Espressa-mente; ou até um "cervello in farinato", viajou à Itália o Leo (e isto deve ser bem bom).
Até com choco (sépia) se parece, sim, Maria, por que não? Ovas de peixe foi o palpite do Pablo e imagino que, empanadas, devem ficar bem gostosas também. O bicho do mato arriscou um peixinhos da horta. Claro, vagens da horta empanadas, não peixes de verdade. E isto dá água na boca. Enfim, tudo poderia ser.

Mas o troféu turu da semana quem leva mesmo é a Letrícia, do blog No Calor do Fogão. Como ela advinhou, não sei. Esperta a menina. Pelo menos me tirou a culpa de enganadora. Obrigada a todos que participaram.



Descobri um pacote de turu congelado esquecido no freezer, mandado por minha amiga Jerônima, lá da Ilha do Marajó. Aproveitei pra fazer estas receitinhas.
Para empanar
, como mostra a foto do post anterior, apenas temperei com sal e pimenta-do-reino, rolei no fubá e fritei no óleo quente. Eliana me viu temperando e disse que não comia aquela coisa lambisguenta nem que estivesse passando fome. Mentira, como diz a Nina Horta: se tem fome, come sim. Melhor que farinha de bró, aposto. Depois de frito, convenci a moça a comer e ela não se arrependeu. Repetiu. Fica muito bom, lembra aneis de lula, mas com sabor muito peculiar, que só o turu tem. O terroir do mangue. É só se despir do preconceito.

Para a receita da foto acima, turu no azeite, alho e salsa, simplesmente joguei pedacinhos na frigideira quente. Assim que mudaram de cor, escorri o caldo (ele solta uma aguaceira danada) e reservei a carne. Dourei alho em azeite, juntei o turu, temperei com sal e pimenta-do-reino, tirei do fogo, acrescentei cheiro-verde e nhac com batatas polvilhadas com pimentón de la vera.

E aqui um vídeo que passou no Globo Rural da semana passada na fazenda dos meus amigos, Jerônimo e Brito (pais da minha amiga Kátia Brito), de onde veio o meu turu. O vídeo mostra, além do turu em seu habitat, ainda a famosa moqueca de filhote no leite de búfalo. Ai, saudade.



sexta-feira, 24 de abril de 2009

O que é, o que é?


Fritinho, assim, é bem bom. Mande seu palpite. Resposta na segunda-feira. Até lá e bom fim de semana!

Fitoterapia e maridão na TV


Ele é divertido mas, quando Dr. Marcos bota o jaleco, é a seriedade em pessoa.

Durante esta semana o telejornal Rede TV News tem mostrado reportagens de uma série muito boa sobre Fitoterapia. Mostrou o conhecimento popular e o poder das ervas medicinais (e muitas delas vão pra panela), entrevistas com pesquisadores, centros de pequisa, farmácias vivas etc. E hoje vai mostrar como os médicos estão lidando com mais este arsenal terapêutico nos consultórios, além da produção de fitoterápicos em laboratórios. O Marcos, que se diplomou no assunto e aplica os conhecimentos na otorrinolaringologia, quando é o caso, deu entrevista ontem, que deve lhe render hoje seus dois minutos de fama. Ou amanhã (pois Marcos acabou de saber que a série fez tanto sucesso que decidiram prolongá-la até sábado). Não percam. Rede TV, hoje ou amanhã, às 21h10.

Obs: no fim da tarde, aqui no Come-se, mais uma charadinha para o fim de semana!

Encontro de Gastronomia Franco-brasileira

As conversas sobre o ano da França no Brasil já chegaram na cozinha. No começo do próximo mês, entre 5 e 8 de maio, o Senac e Carrefour promovem o Encontro de Gastronomia Franco-Brasileira – A Influência das Técnicas Francesas na Culinária Brasileira e a Discussão sobre Regionalidades e Terroir, com a participação dos chefs franceses Yves Camdeborde e Christian Constant, entre outras personalidades.
Atividades no Centro Universitário Senac – Campus Santo Amaro
O que:
Mesa-redonda com jornalistas e chefes convidados – Auditório 1 do Centro de Convenções
Quando: Dia 5 de maio de 2009, das 15 às 17 horas
Quanto: R$ 50,00
O que
: Aula demonstrativa e degustação comandada pelos chefes franceses Yves Camdeborde e Christian Constant
Quando: Dia 7 de maio, das 10 às 12 horas – Sala Demo no Centro Gastronômico
Quanto: R$ 70,00
Obs
.: Alunos e professores de quaisquer instituições de ensino e ex-alunos do Senac têm 50% de desconto.
No Instituto Carrefour
O que
: Workshop com clientes e convidados
Quando: Dia 6 de maio, das 13 às 15 horas
Informações pelo telefone: (11) 5180-4621 ou pelo e-mail: comunicacao@carrefour.com
Para saber mais sobre os participantes e programação do encontro, veja
AQUI.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Granola circunstancial


Fazia tempo que não fazia granola. Aqui em casa há fase das coisas a depender dos horários da família, das atividades diárias e sobretudo do humor da cozinheira. Houve fase de comermos granola no final da tarde; outra em que não era granola, mas o Marcos fazia uma espécie de muesli antes de ir para o aikido, a que chamava de argamassa pois julgava ter ali tudo o de que precisava: energia fornecida pela aveia; proteína, do leite em pó; minerais, fibras e vitaminas, do mel, da banana, do germe de trigo, das nozes. Amassava tudo num pratão e mandava ver. Eu não participava disto, comia qualquer outra coisa e nesta época quase não havia jantar nos dias de aikido.
No café da manhã também há fases. Agora, já há uns 5 anos, tomamos kefir batido com frutas, pão caseiro, manteiga e café. São fases, mas de um modo geral sempre foi uma refeição prosaica onde quase nunca entram queijos, geléias, granolas e cereais.
Há uns dois anos Marcos vai para o dojo direto do trabalho, sem comer direito, e passamos a jantar às 10 horas da noite. Continuamos a jantar neste horário, mas pelo menos agora ele chega em casa menos ávido de fome, pois passou a comer uma pratada de granola com banana antes do treino, na copa do consultório. É um jeito prático de comer bem sem precisar apelar para as facilidades gordurosas e requentadas das cantinas ou barrinhas de cereais grudentas. Só precisa levar uma banana de casa e juntar lá mesmo um pouco de leite em pó é água. A banana pode até ser dispensada. E, pronto, tem lá uma refeição que se pode comer no prato.
Bem, a vantagem de se preparar em casa é que você pode incorporar ingredientes mais nobres ao seu gosto, usar um mel que você conheça e um azeite mais saudável no lugar dos óleos refinados que se usam industrialmente. O sabor do azeite, no final, não será perceptível, mas fará diferença enorme no perfil de ácidos graxos. Fora o preço, é claro (embora não tenha calculado, pois tinha algumas coisas na despensa).


Geralmente a receita é circunstancial. Abro a despensa e vou juntando grãos disso, farelo daquilo e as frutas que tenho. Desta vez fomos ao Mercado da Lapa, compramos algumas coisas que julgamos adequadas e assamos numa travessa de fazer pernil, cheinha. Rendeu 4 quilos. Um tanto o Guilherme levou, outro tanto comi com kefir e banana, mas a ração é mesmo para o Marcos, que adora estas coisas que dão sustança e ainda são crocantes e nutritivas. E, por isto, já está de olho no volume do vidrão que vai descendo dia a dia.
Antes que acabe, deixo aqui a receita que anotei enquanto fazia no olhômetro. Não gosto de dar calorias dos pratos que faço para o blog (profissionalmente, ok), mas neste caso achei interessante. Dá para comparar com o que você come no café da manhã e, quem sabe, substituir de vez em quando tudo aquilo por uma pratada de banana com granola e iogurte.
Granola à moda da casa
400 g de aveia em flocos grossos
300 g de aveia em flocos finos
300 g de germen de trigo cru
250 g de flocos de cevada
250 g de flocos de centeio
200 g de farelo de trigo
150 g de flocos de amaranto
200 g de sementes de girassol
350 g de xerém de caju (a castanha já picada)
100 g de linhaça dourada
1 colher (sopa) de canela em pó (opcional)
1 xícara de melado
1/2 xícara de mel
1 xícara de azeite de oliva
300 g de uvas passas pretas
300 g de uvas passas brancas
200 g de damasco seco picado
250 g de flocos de coco seco
Numa assadeira bem grande, coloque as aveias, o gérmen de trigo, os flocos de cevada, os de centeio, o farelo de trigo, os flocos de amaranto, as sementes de girassol, o xerém de caju, a linhaça douradae a canela. Misture bem usando as mãos. Numa tigela coloque o melado, o mel e o azeite. Mexa bem com batedor de arame ou colher até virar um creme. Despeje sobre os grãos e incorpore à mistura esfregando-a entre as mãos, até virar uma farofa úmida. Leve ao forno médio e deixe assar por cerca de 1 hora, mexendo a cada 10 minutos para evitar que queime nos fundos, na superfície e nas laterais. Revolva bem e volte ao forno. Deixe até ficar dourada uniformemente e quase seca (se ainda estiver um pouco úmida, não tem problema - ela secará depois de fria). Tire do forno, junte as passas, o damasco e o coco. Misture bem e espere esfriar antes de guardar em vidros fechados. Se quiser, junte outras frutas secas, nozes, avelãs, amendoim torrado, castanha-do-Brasil etc. Ou altere os ingredientes ao seu gosto.
Rende: 4 quilos (cada meia xícara, que equivale a uma porção, pesa 60 g - ou seja, isto dá para mais ou menos 66 porções)
Cada porção de 60 g tem: 250 Calorias; 6,36 g de proteínas; 34,9 g de carboidrato; 11,5 g de gordura (da melhor qualidade, graças ao azeite) e 11,5 g de fibras, além de teores significativos de cobre, selênio, magnésio, zinco, vitamina E e as complexo B.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Dia da Mandioca ou Sopa de sagu com caldo de mandioca


Só neste post, quatro ingredientes de uma só espécie vegetal. Mas tem muito mais.
Talvez, mais apropriado que comemorar o dia do Descobrimento do Brasil, afinal já estava pra lá de descoberto, seja mesmo celebrar hoje o Dia da Mandioca, instituído em 2007 pela Embrapa. Neste momento, lá na Câmara Municipal de Cruz das Almas (BA), o pesquisador e entusiasta da raíz, Joselito Motta, está conferindo a palestra “Uma exaltação à raiz do Brasil: do descobrimento aos dias atuais". Enquanto ele fala - ia começar às 15 horas-, lá fora o assunto continua sendo a raiz. Na área externa da Câmara e nas padarias, pizzarias e restaurantes da cidade, haverá degustação de mingau de tapioca, pão com fécula, pizzaioca (a pizza feita com massa de tapioca) e maniçoba, aquele prato feito com as folhas da mandioca e carnes secas.
E por aqui também prestei minha homenagem pequena e solitária com a Eliana que, como boa baiana, só tem a agradecer às raizes deste Brasil. Faz tempo que tinha esta ideia, de uma sopa com sagu, que é feito com o amido de mandioca, e o caldo extraído da raiz triturada. Fosse este caldo extraído da mandioca brava, fosse mais concentrado, fermentado e temperado, poderíamos chamá-lo de tucupi. Mas é só um caldo mesmo, com o sabor bom da mandioca mansa, macaxeira ou aipim. A sopa ficou refrescante, meio baiana, meio asiática e caiu bem com um friozinho leve que vem chegando. Não pensem que joguei fora a massa que restou, afinal é com ela que é feita a bijajica - não o biscoito, mas o cuscuz de Paulo Lopes - SC, com amendoim cru. E a goma, que em 1 hora já tinha acentado, usei para fazer 8 tapioquinhas que comemos com manteiga acompanhando o café.
Mesmo na mandioca mansa e branca, o caldo extraído é amarelo.

Sopa de sagu com caldo de mandioca
800 g de mandioca
1 litro de água
250 g de cubos de carne de frango (peito ou filé de coxa e sobrecoxa)
1 colher (chá) de sal
1 colher (sopa) de pimentas ardidas e doces, picadas
1 fatia de gengibre ralada
1 dente de alho inteiro
1 raminho de alfavaca
2 colheres (sopa) de coentro picado
1/2 xícara de bolinhas de sagu de mandioca
1 xícara de leite de coco
1 colher (sopa) de suco de limão
1 colher (sopa) de cebolinha picada
Corte a mandioca em cubos e bata no liquidificador com a água até ficar uma mistura cremosa. Faça isto em duas vezes para não sobrecarregar o aparelho. Coe em pano, apertando bem. Recolha o suco numa jarra e reserve a massa, para fazer bijajica (ou bolo etc). Você deverá obter cerca de 1 litro de líquido. Epere 1 hora para acentar o amido no fundo do recipiente. Despeje o suco com cuidado (para não misturar de novo com o amido) numa panela. Reserve a goma sedimentada para fazer tapioquinhas. Bem, ao suco de mandioca da panela, junte os cubos de carne de frango, o sal, as pimentas, o gengibre, o alho inteiro, a alfavaca e metade do coentro picado. Leve ao fogo alto e deixe até ferver. Abaixe o fogo e junte as bolinhas de sagu. Deixe cozinhar, mexendo de vez em quando, por cerca de meia hora ou até o sagu ficar transparente. Se for preciso, junte mais água quente. Despeje o leite de coco e espere voltar a ferver. Desligue o fogo, acrescente o suco de limão, o restante do coentro e a cebolinha e sirva.

Rende: 4 porções



A goma que ficou no fundo da jarra foi seca na superfície com um guardanapo de papel e, depois, os torrões foram passados por peneira sobre uma frigideira antiaderente. No fogo, o amido se junta e coagula. Neste momento, basta virar para cozinhar do outro lado.

E comer ainda quente com manteiga. Nhac. Rendeu 8 tapioquinhas. O passo-a-passo mais completo você poderá ver AQUI.
A bijajica, cuja receita está AQUI.

A bertalha



Desculpem o sumiço. Desta vez, aproveitei a ponte do feriado para colocar em dia trabalhos atrasados. Bem, mas voltando às comidas...
Foi depois de adulta que me deparei com as folhas da bertalha nas feiras do Rio de Janeiro. Não me lembro delas na infância aqui em São Paulo ou no sítio dos meus avós no Paraná. Ainda hoje não são vistas facilmente por aqui. Estas, encontrei na feirinha orgânica do Parque da Água Branca. Sempre que encontro, compro porque as folhas gordinhas, macias e algo visguentas são deliciosas, com sabor rústico de mato. Sem ser amargas ou picantes.
Originária do sudeste da Ásia, a bertalha é hoje cultivada na Índia, Malásia e Filipinas, mas também é vista em toda a África tropical, Caribe e América do Sul. E embora seja uma cultura adaptada a uma variedade de solo e climas, prefere regiões com chuvas abundantes e bem distribuídas durante o ano e temperaturas mais elevadas. Para quem acha que é parente do espinafre, saiba que este membro da família das Baseláceas sequer é parente do espinafre verdadeiro (Spinacia oleracea L., família Chenopodiaceae), mas tal é a semelhança entre as folhas das duas espécies que é conhecido em inglês como malabar spinach, ou ainda, em português, como espinafre indiano, espinafre do Ceilão ou espinafre africano.

São três os tipos de bertalha, todas elas trepadeiras: a Basella alba, com folhagem, galhos e hastes verdes e flores brancas; a B. rubra com hastes, pecíolos e nervuras avermelhadas e flores rubras e a B. cordifolia, com folhas verdes e grandes, com formato de coração - talvez seja esta a que comprei, da foto. Mas no Brasil, o tipo alba é o mais comum - tem folhas grandes, grossas, algo rugosas, suculentas, tenras, firmes e brilhantes.
Não imagino como seja o plantio, mas uma coisa é certa: como são trepadeiras, são plantadas com tutoramento e colhidas depois de cerca de 60 dias – cortam-se folhas individuais ou os galhos terminais a uma altura de 40 a 50 centímetros. De qualquer forma, enfiei um galho na terra e até agora ele permanece verdinho e tenro. É uma planta rústica e duradoura, produzindo durante todo o verão, quando várias outras folhas são escassas e, por isto, talvez minha tentativa de obter folhas para o inverno resulte infrutífera. Mas esta característica faz dela um ótimo recurso alimentar, principalmente em áreas mais pobres, onde não há abundância de vitamina A, da qual é fonte na forma de betacaroteno, uma pró-vitamina A presente nas suas folhas verde-escuras.
Seu sabor é marcante, mas singelo. Lembra um pouco o espinafre no sabor, Mas, tanto folhas quanto talos mostram-se, ao serem cortados e mastigados, mucilaginosos quase como o quiabo, por isto, mais que o espinafre lembram a beldroega ou a ora-pro-nobis que também tem este visgo.
Na Bahia, pode compor o caruru de folhas, refogado feito junto com outras folhas como taioba e lingua-de-vaca e as de quiabo, além de cebolas, castanha de caju, amendoim, gengibre, azeite de dendê, camarão seco e leite de coco. E, embora as folhas cruas sejam crocantes e possam ser preparadas como saladas, sua forma mais comum de consumo é mesmo refogada ou cozida com outros vegetais. Pode ser usada em sopas, cremes, suflês e bolinhos. É que, como o espinafre ou a taioba, possui muito oxalato de cálcio que causa sensação de pinicamento na língua. Por isto, é conveniente escaldá-la e desprezar a água antes de ser adicionada em qualquer outro prato. Os oxalatos atrapalham a absorção de cálcio e ferro e podem ser ruins para quem tem tendência a formar cálculos renais de oxalatos.
Para fazê-la refogada, separei as folhas e galhos mais tenros, joguei em água fervente salgada e deixei cozinhar só um minuto antes de escorrer bem. Numa frigideira dourei alho em azeite, mas poderia ter fritado junto um tantinho de bacon, e refoguei aí rapidamente as folhas. Servi com carne de porco assada.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Um pernil para a Mônica e a convidada Denise

Minha amiga querida Mônica Manir deu azar neste ano. Justo no fim de semana de comemorar o aniversário calhou o feriado de Páscoa. Para completar, estava de plantão no jornal (ela trabalha no caderno Aliás, do O Estado de S.Paulo). Pensou em chamar os amigos e comemorar numa pizzaria depois do plantão, para não passar em branco. Mas fiquei com vontade de oferecer a casa e umas comidinhas, já que ela e o Carlos estão morando longe, em Vinhedo, e aqui seria mais prático para os convidados. E poderia chamar quem quisesse.
O Carlos é nosso amigo agrônomo de longa data - Marcos, ele e eu estudamos juntos no cursinho pré-vestibular. Mônica é jornalista, amiga também de mais de uma década, que conheci quando trabalhei para a revista Claudia. Apresentei os dois porque achei que combinavam; eles se apaixonaram; as famílias aprovaram e estão juntos há uns cinco anos. Por isto tenho um carinho especial de madrinha pelos dois. Em casa poderíamos ficar mais à vontade, além de comer mais, beber mais e rir mais, como é de nosso feitio quando nos encontramos com a Kátia Stringueto, que também é jornalista, uma das melhores amigas que se pode ter e que faz aniversário amanhã.
Bem, assei um pernil para 15,
amassei uns pães, fiz uma pastinha de kefir com ervas frescas e botei na roda a geléia de pimenta. Comemos, bebemos e rimos e cadê os outros convidados? Quem mandou aniversariar no feriado? Todo mundo viajando. De qualquer forma, estava divertido. E talvez viesse uma amiga que ficou em São Paulo. Com acompanhantes? Tomara.
Antes que a amiga ligasse dizendo que não estava se sentindo bem, ouvimos alguém batendo palmas. Não tenho muros e deixamos a portinhola da porta aberta para ventilar. A pessoa não deve ter visto a campainha, subiu o lance de escada e bateu palmas, já quase na sala. Corri lá e fui abrindo a porta. Abraços, beijinhos, quem é você mesmo? Ah, eu vim buscar o kefir. Nisto, já estavam comigo a Mônica e a Kátia. Poxa, é mesmo. Denise! Tinha esquecido, entra, vamos entrando.
Era a Denise, leitora do blog que escreveu, virou amiga, pediu kefir e eu disse que podia passar em casa, que não sairia no sábado à noite, já que tinha a festinha. Mas estou tão acostumada a levar cano de queredores de kefir, que combinei e esqueci completamente. Veio ela com o marido e a mãe, que mora em Rondônia. Venham comemorar, que está faltando gente nesta festa! - Marcos, Carlos, a Denise! Fátima, Paulo! Prazer. De repente a mesa encheu, buscamos cadeiras, danamos a conversar sobre a vida em Rondônia da mãe, o trabalho de comissária da Denise, o cachorro do casal.
Marcos e Carlos só se tocaram que nenhuma de nós nunca tinha visto antes aquela família quando alguém mencionou a palavra Kefir. Até então não estavam entendendo nada, achavam que era a tal pessoa que viria, com acompanhantes. No fim, estávamos todos ali como amigos de velha data numa mesa de bar. Conversamos, comemos, bebemos, rimos; todo mundo enturmado. Pena que não ficaram muito. Pena que não tiramos fotos.
Mônica ficou feliz com a casa cheia. E tive que jurar que não se tratava de armação, que não eram figurantes e que não receberiam cachê pela animação da festa. Rimos muito da situação surreal. Todos nós adoramos a Denise e sua família e nossa festa ficou muito mais animada. Obrigada, Denise, por ter vindo na hora certa com as pessoas certas.


Mas não pudemos evitar muitas gargalhadas pela situação inusitada com final feliz. E a Denise sabe disto (foto do Carlos).




O pernil não teve segredo. Temperei um dia antes e fiz de jeito parecido ao que já fiz aqui. Com a diferença que embrulhei em papel celofane cruzado para conter a marinada. Assei um pernil de 3 quilos em forno baixo por 5 horas e no final, tirei o celofane e deixei dourar em forno mais alto. No tempero, usei pimentas secas, pimenta-dedo-de-moça, folhas de louro, alho, limão, sal, e folhinhas de manjericão que plantei nuns furinhos feitos com faca no pernil na hora de ir ao forno. E uma colher (sopa) de sal.

Lasanha do Duilio



Minha amiga Rita Atrib, do Le Petit Gourmet, começou com o Duilio um projeto bem legal no restaurante, que já mostrei aqui, que é chamar para fazer o cardápio e pilotar as panelas por uma noite amigos que amam cozinhar mas não são chefes. Amadores da cozinha mostram ali seu talento. E, olha, o Duilio não fez feio. Alegre, tranquilo, compenetrado e competente. Uma atrás da outra as lasanhas foram saindo, enfeitadas com florezinhas, servidas no bufê. Eu só não degustei a de bolonhesa de proteína de soja (já comi muita pts na vida de natureba, enjoei). Fiz logo um pratão com o menu degustação. Todas aprovadíssimas. A afrodisíaca estava deliciosa, sabe-se lá com que ingrediente secreto, mas o fato é que cheguei em casa tarde da noite chuvosa, com todos dormindo pesadamente. Para quem não foi, o melhor a ser feito agora é ver o vídeo.


quinta-feira, 16 de abril de 2009

Almoço baiano: vatapá com quiabo da Eliana e acarajé à minha moda



Hoje voltei do almoço, satisfeita, leve, feliz. Isto, apesar do menu: acarajé com vatapá. Eliana viu o camarãozinho seco que comprei semana passada e logo lembrou do vatapá, cuja receita foi presente da filha da Dona Dalva, uma vatapazeira talentosa da sua cidade, Santa Luz, na Bahia. Ela mostrou como se faz, Eliana aprendeu, me ensinou e eu divido com vocês.
Quando me chamou para ver fazer, os ingredientes já estavam caprichosamente cortados e arrumados. Ela, que dizia não saber cozinhar, aos poucos está se revelando. Mas para o seu vatapá, você tira a pele do tomate?, perguntei. Não, mas aqui sei que vai ficar mais caprichado, respondeu.
Confirmando agora o nome da sua cidade, chamei-a para ver o lugar no Google Maps. Olha lá, olha lá, olha lá o estádio. Ali é a casa do prefeito. Meu Deus, é a estradinha do meu povado. Vai, vai, sobe mais. Entra aí. Olha a escola. Esta é a fazenda que cria cabras caras de quinhentos reais. Ó lá o pé de tamarindo na porta. A plantação de sizal. O açude, o tanque de pedra. Anda mais. Aí o povoado Lagoa do Boi. Meu Deus é a minha casa com telhado pretinho. Olha o pé de juazeiro. Vamos pra casa do pai. Pega esta estradinha de terra aí. Vai embora. Entra aí, entra aí. Ah, a casa do pai.... , a rocinha de feijão, a plantação de palma, que saudade .... Bem, meu e dela, olhos marejados.

Já vi muitas versões de vatapá - não sei quem era o espessante ancestral e dúvidas ainda pairam sobre sua origem. Se o prato é brasileiro o espessante poderia ser a mandioca ou o milho. Se africana, quem sabe o quiabo? Acho que já li a respeito, mas vai saber onde e em que canto da memória a informação se encapsulou. Contribuições são bem-vindas.
A questão é que vatapá engrossado com farinha já tinha visto, inclusive o do Pará é feito assim. Mas, com quiabo complementando, não conhecia. E é assim a receita da Eliana, já também, é claro, adaptada em relação ao que aprendeu. A espécie de pirão ganha uma leveza surpreendente com o legume, que confere a ele uma fluidez sedosa. E, com fibras e mucilagens do quiabo, não pesa e não é indigesto apesar dos ingredientes gordurosos. Também levou pouco dendê e nenhuma pimenta. Não leva pimenta?, perguntei. Não, porque geralmente é comido também por crianças. Eu mesma, não fosse tão solidária com os que vêm jantar, voltaria à cozinha agora para comer a sobra. Que caberia, caberia.

Ela fez e eu só anotei. Como teria vatapá, nada mais justo que comê-lo com acarajé, o nosso falável dourado. Tinha aqui, por sorte, um pacotinho de feijão fradinho já descascado e triturado, uma espécie de farinha instantânea para os bolinhos, que veio de brinde com um vidrinho de dendê puro. A verdade é que o brinde era o azeite, porém foi o único puro que encontrei naquela banca onde comprei os peixes secos. O resto era misturado com óleo de soja. E mistura por mistura, prefiro fazê-la aqui com o meu óleo ou azeite de oliva. E nem era tão instantâneo assim, pois tem que ficar de molho durante 3 horas com água batida com cebola. De qualquer forma, faz um ótimo acarajé. Só economiza o tempo de deixar o feijão fradinho de molho, tirar as peles e olhinhos e pilar. Fritei em óleo misturado com um pouco dendê, só o suficiente para que tingisse a gordura. Teria aumentado a proporção se tivesse mais azeite, o que não era o caso mas não também não era impeditivo. Os bolinhos ficam leves e deu para comer uns cinco. Como o vatapá não levou pimenta, fiz um molhinho à parte para colocar em cima. Ah, ainda bem que daqui a pouco já é hora do jantar!
E vamos ao que interessa:


Em cima, os ingredientes. Vejam que ela usou coentro-do-pasto ou coentro-da-índia (a chicória-do-pará) em vez do coentro comum - ambos têm o mesmo sabor. Do lado, o quiabo batido sendo adicionado ao pirão. Embaixo, o vatapá pronto.
Vatapá com quiabo, por Eliana Santiago

150 g de camarão seco limpo

300 g de quiabo sem os cabinhos, cortados em pedaços
2 tomates médios bem vermelhos, sem pele e sem sementes (220 g)
3 cebolas pequenas (120 g)
1 pimentão vermelho pequeno picado (120 g)
1 colher (sopa) de gengibre picado
4 folhas grandes de coentro-d0-pasto (coentro-da-índia, coentro caboclo ou chicória-do-pará) - ou 4 colheres (sopa) de coentro comum picado
4 colheres (sopa) de salsa picada
2 colheres (sopa) de cebolinha picada
1 xícara de amendoim torrado e sem pele (160 g)
3/4 de xícara de castanha de caju picadas ou xerém (100 g)
1 xícara de farinha de trigo (120 g)
Água
1 colher (chá) de sal ou mais, se necessário
3 colheres (sopa) de azeite de dendê
1 xícara de leite de coco (240 ml)

Lave bem o camarão e deixe de molho por três horas, trocando a água duas vezes neste período. Escorra bem e reserve. Coloque o quiabo numa panela e cubra-o com água. Leve ao fogo e cozinhe por cerca de 20 minutos ou até ficar bem macio. Escorra (guarde a água para usar na receita, junto ou no lugar da água quando solicitada). Coloque no liquidificador os temperos: tomate, cebola, pimentão, o gengibre e ervas. Bata até ficar cremoso. Se precisar, junte um pouco de água (ou a água do quiabo). Tire a mistura do liquidificador e coloque no copo o amendoim. Junte um pouco de água só para conseguir bater até virar uma pasta cremosa. Tire do liquidificador. Bata agora as castanhas com um pouco de água até virar uma mistura cremosa. Despeje junto com o amendoim. Bata agora o camarão com um pouco de água. Despeje numa panela grande, junte o amendoim, a castanha e o camarão. Leve ao fogo, mexendo. Enquanto isso, bata no liquidificador a farinha com uma xícara de água e despeje na panela. Cozinhe, sem parar de mexer, até a mistura ficar espessa. Bata o quiabo no liquidificador até virar uma pasta e junte à mistura. Mexa bem até ferver. Junte o azeite e misture bem. Por último, coloque o leite de coco e deixe ferver. Prove e corrija o sal, se necessário. Sirva com arroz, peixe em molho, frango. Ou com acarajé.


Rende
: 12 porções (12 conchas de 160 g)



Acarajé à minha moda (a receita básica veio no rótulo)
1 cebola média (150 g)
2 xícaras de água (480 ml)
1,5 colher (chá) de sal
1 pacote de 500 g de feijão fradinho moído
Para fritar: 2 xícaras de óleo + 1/4 de xícara de azeite de dendê + 1 cebola pequena
No liquidificador bata a cebola com a água e o sal e junte à farinha de feijão fradinho. Misture bem e deixe em repouso por 3 horas. Bata bem até ficar uma massa leve e fofa. Num tacho pequeno, aqueça a mistura de óleo até ficar bem quente (sem deixar esfumaçar). Coloque a cebola pequena inteira na panela (enquanto há umidade junto da gordura, a temperatura se mantém estável). Faça bolinhos usando duas colheres, moldando como se moldam queneles. Frite até ficar dourados, virando para dourar por igual. Sirva com o vatapá, vinagrete, salada, molho de camarão e de pimentas.
Rende
: cerca de 3o unidades
Nota
: para o molho de pimenta, refoguei 1 cebola pequena em 2 colheres (sopa) de azeite de dendê. Juntei 3 pimentas ardidas fatiadas (2 verdes e 1 vermelha), desliguei o fogo, polvilhei sal e pronto.
Sobre o faláfel e o acarajé, por J. A. Dias Lopes.
Do texto O pai do acarajé baiano, publicado no jornal O Estado de S. Paulo, Caderno Paladar. Para ver o texto completo, clique aqui.
A receita do bolinho acompanhou as invasões dos árabes, inclusive as que eles empreenderam à África Ocidental, na qual estiveram centenas de vezes entre os séculos 7º e 19. Agora, encontram-se na região, entre outros países, Camarões, Daomé, Nigéria e Togo. Ali, segundo se diz, o falafel ingressou na culinária de algumas etnias, a começar pela dos iorubás. O que o nosso acarajé tem a ver com isso? Simplesmente, eram iorubás muitos contingentes de negros trazidos como escravos para a Bahia. Eles nos transmitiram o candomblé e, reforçando a dedução de Leila Kuczynski, também o filho do falafel. Com o ingrediente básico já trocado pelo feijão fradinho, chamavam-no akkrá. Até hoje é conhecido por esse nome em Camarões, conforme o livro The Essential African Cookbook (Anness Publishing, Londres, 2001), da chef e pesquisadora guiana Rosamund Grant. No Brasil, o bolinho chegou batizado de acará ou acarajé (acará, bola de fogo; jé, comer), com função sagrada no candomblé. Para o generoso e sensual rei Xangô, comandante dos trovões e da justiça, oferecem-se os maiores, enquanto os pequenos e redondos se destinam a Iansã, uma de suas mulheres, guerreira incansável, orixá dos ventos e das tempestades. Axé pelo legado precioso, bravo e sofrido povo iorubá!
J. A. Dias Lopes

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Sardinhas em lata. E cavalinhas.

Cavalinhas não têm escamas. Mais fáceis de limpar e carne igualmente saborosa.
Sei, sei, o assunto peixes era para a semana passada, a Santa. Mas come-se aqui quente e frio também. Neste caso, bem curtida, geladinha. E, afinal, ainda estamos na época de rechonchudas sardinhas e cavalinhas.
Além de um bacalhauzinho de nada que comi na sexta-feira por mero acaso, me esmerei nestes peixes populares que estavam lá meio desprezados na peixaria entre outros peixões mais festivos e caros. E, se quisesse, teria que levar inteiros, para limpar em casa, porque não iriam desperdiçar tempo e peixeira para descamar e eviscerar os peixes mais baratos da banca. Tudo bem, não me importo de limpar peixes. Descamo debaixo da água com habilidade para que as escamas não voem na minha testa e, com dois dedos, seguro nas guelras e puxo toda a tripa de uma só vez. É rapidinho. Depois, é só lavar a mão com pasta de dente e ela está nova pra outra.
Há tempos queria fazer uma versão desta receita que é aquela básica de muitas famílias: 1 kg de sardinha, 1 xícara de óleo, 1 xícara de molho de tomate, 1 xícara de vinagre, panela de pressão. Fiz adaptações para usar tomates frescos e orgânicos. Também queria fazer direto numa lata e assim evitaria a combinação de alumínio + ácido. Isto porque não tenho panela de pressão de aço inoxidável e o vinagre e/ou o tomate fazem um molho muito ácido que reage com o alumínio, liberando o metal para o meio. Basta lembrar de velhas panelas de molho de tomate furadas. Usei minha masala dabba, aquele porta-temperos indiano. Coloquei a lata um pouco afastada do fundo da panela para que não entrasse água e cozinhasse no vapor. À receita, pois!
Nem todos os ingredientes foram batidos juntos

Repeti a mesma receita com sardinhas e cavalinhas

As sardinhas: o ácido e o calor fazem as espinhas ficarem macias, como as de lata compradas.

Pura e simples assim. Ou em saladas, tortas, pastinhas
Sardinhas em lata
1 kg de sardinhas inteiras (rendem 600 g de sardinhas limpas, sem cabeça)
380 g de tomates maduros (3 médios)
1/2 xícara de azeite
1/2 xícara de vinagre de vinho branco
1 colher (chá) de grãos de pimenta-do-reino preta
1 pimenta dedo-de-moça inteira
2 dentes de alho
1,5 colher (chá) de sal
150 g de cebola cortada em rodelas (1 média)
2 folhas de louro
Folhinhas de dois galhos de manjerona fresca
Limpe bem as sardinhas, tire a cabeça, deixe as espinhas. Parta os tomates ao meio, tire as sementes e reserve-as. Bata no liquidificador os tomates com o azeite, vinagre, pimenta-do-reino, pimenta dedo-de-moça, alho e sal. Junte a cebola fatiada, as sementes de tomate reservadas, as folhas de louro e as folhinhas de manjerona. Coloque metade do molho no fundo de uma lata ou marmita de aço inoxídável. Ajeite as sardinhas, uma ao lado da outra, e jogue por cima o restante do molho. Feche bem a lata. Coloque 1,5 litro de água numa panela de pressão grande sem bordas, apoie sobre o fundo um aro de metal ou cesta de vapor e coloque por cima a lata, de forma que ela não encoste na água (em embulição, poderia entrar pela tampa da lata). Feche bem a panela e leve ao fogo alto. Quando ganhar pressão, abaixe o fogo e cozinhe por 1 hora. Só abra a panela depois de totalmente fria - pode deixar de um dia para outro. Conserve as sardinhas na geladeira por até uma semana e sirva pura ou use para fazer tortas e saladas. Na hora de servir, junte um pouco mais de azeite extra-virgem e nhac.
Rende: 12 sardinhas








O aro de metal dentro da panela de pressão

Cavalinhas em lata. Fiz igual, só que tirei o excesso de espinhos finos com uma pinça e cortei em pedaços.